domingo, 27 de novembro de 2011

Ilha



Aquela solidão de ilha, de ostra
Noite após noite
Cantando vento
Esperando gaivotas
Contando ondas
Imaginando coisas
Sem saber sair
Agarrando-se a tudo
A gravetos, conchas, areia
O vento vindo
O vento indo
Medo dos peixes
Medo da lua
Medo de mim.

Marcos Vidal

quinta-feira, 24 de novembro de 2011



Meu corpo à beira do rio
Se vai sem vida
Saudade antiga
De sonhos reais.

Marcos Vidal

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Cidade Invisível

Imagem: Argia, cidades invisíveis - Aquarela em papel - Lutero Proscholdt


Antes que a lua surja de novo, vamos comendo estrelas. Antes, rosas com limão espicaçam a boca do céu. Canto da mansarda sob um filete de luz. Minhas mãos molhadas escorregam sobre objetos, sobre os cômodos. Deslizo meus pensamentos antes da virada da noite, como se fosse possível estar diante da verdade que se apresenta toda semana. Pequenas borboletas disparam buscando o sol. Elas se perdem sobre pétalas de rosas desbotadas. Besouros ensurdecem antes de chegarem ao solo. O peso da nuvem descarrega água sobre tudo. A cidade está sobrecarregada de fios e cimentos sem cores, desbotada como as rosas.
O musgo vai comendo as paredes e marcando tudo que nasce à margem. Peixes esnobes sobem rio à cima para desovar. Bem perto dali, um pássaro canta o marasmo da cidade. Portas escancaradas abusam da privacidade das sombras, enquanto gnomos invadem jardins em busca de cogumelos. Uma nuvem de libélulas azuis segue pelo vão da cidade, mais à frente, girassóis esbanjam franjas, enquanto esperam por beija-flores.
Se apuramos bem os ouvidos seremos capazes de ouvir a sinfonia da cidade. O olho que vê tudo sabe. Lá não existe tempo, somente sensações de tempo. Laranjas cruzam em busca de sucos mais próximos ao sol.
Duas meninas que pensam existir permanecem estáticas. Uma sorri, enquanto a outra imita os caracóis com os olhos.
A cidade adormece suspensa na expectativa de ser descoberta.

Marcos Vidal

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Clarice




Marcamos na árvore
da fotografia.
Ela repetiu o figurino
de inverno.
Nada disse ao me ver,
mas seu olhar encruzilhava
e enxovalhava minha ânsia.

Ela pousou letras
em meu rosto
quando eu ainda
graduava pensamentos.

Falou do instante
em “água viva”
dos mistérios e labirintos
enquanto aprumava
meu olhar e ensaiava palavras.

“Clarice, tua visão
teus fragmentos do mundo
fizeram-me seguir por dentro
o vazio de mim mesmo.
Invenções... abismos
E eu nunca mais estive sozinho”.

Ela sorriu...
Afastei-me um pouco e a fotografei
com meus olhos
amparados pelos seus
apertados e enigmáticos.

Marcos Vidal

domingo, 6 de novembro de 2011

Sem Rosto




Lembro-me ainda do dia em
que segurei a felicidade pelos
seios e levantei-a.
Os cabelos a caírem
sobre meu peito
a me sorver de perfumes
leves e abundantes.
Ela, sem motivos,
perdia-se em ilusões falsas
a ludibriar manhãs sedosas
com raiva de mim.
Perfeita em quase tudo, mas
sem rosto
sem endereço.
De tão leve
fez nascer milhões de nuvens.
Então me deixei levar pelos acontecimentos,
pela fragrância dela
que me remetia à coisas concretas
à certezas mundanas, de alegrias.

Marcos Vidal

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Abandono




Por que
você não veio
na hora combinada?
A estrada
já sem fim
agora me guarda.

Meu rosto
madrugada
nem pôde dizer adeus
Então separa
o meu sorriso
do teu.

Por que tu
fostes embora
levando os olhos meus?
Agora estou sem lágrimas
em meu coração ateu.

Por que
tanta mentira
tudo era encantador
até o sonho
que sonhava
era cheio de amor

Por que
você não veio
faz frio agora aqui
dispersa nevoeiro
eu tenho que partir

Teu mundo
meu enleio
mentiu sem
desmentir
o que eu faço agora
sem ter pra onde ir?


Marcos Vidal